O segundo dia do Seminário Nacional sobre Reorganização da Classe Trabalhadora (17) teve início com a apresentação dos artistas Dionísio do Apodi e Renata Soraya, do grupo potiguar “O Pessoal do Tarará”. Com humor crítico, a peça abordou a realidade de exploração e precarização da classe trabalhadora.
Na sequência, dando continuidade aos debates, Virgínia Fontes, professora da pós-graduação da Universidade Federal Fluminense, e Osvaldo Coggiola, docente da Universidade de São Paulo e encarregado de Relações Internacionais do ANDES-SN, abordaram o tema “Crise do Capital e a reorganização da classe trabalhadora”. A mesa foi coordenada por Elizabeth Barbosa, 1º vice-presidenta da Regional Rio de Janeiro do ANDES-SN.
A diretora do Sindicato Nacional destacou que com este seminário, que foi aprovado em seu 41º Congresso, o Sindicato Nacional está dando o pontapé inicial para o debate sobre a reorganização da classe trabalhadora. “Essa mesa trouxe vários elementos e desafios de como podemos avançar nessa discussão”, avaliou, ao final dos debates.
Tanto a docente da UFF quanto o diretor do ANDES-SN abordaram aspectos importantes da história da luta da classe trabalhadora brasileira e internacional, para chegar ao patamar que nos encontramos hoje. Ambos destacaram ser fundamental a unidade entre os diferentes segmentos da classe trabalhadora brasileira e também organização internacional dos trabalhadores e das trabalhadoras para os enfrentamentos necessários aos ataques do sistema capitalista.
Virgínia destacou que há uma contradição interessante, pois há uma espécie de consenso internacional forte, que ultrapassa os grupos de reflexões marxistas, de que “a razão dos nossos problemas é o capitalismo”. Para a docente da UFF, o enfrentamento ao Capital é positivamente a forma de coordenar todas as lutas que estão colocadas.
“Nunca houve uma revolução na escala de lutas que nós temos hoje”, disse. Ela lembrou que mulheres, negros e negras, lgbts são trabalhadores, uma parcela dos povos indígenas são trabalhadores, camponeses são trabalhadores e que a luta precisa incluir todas essas parcelas da classe. “Temos que aprender a construir coletivamente o enfrentamento à catástrofe”, afirmou.
Ela concluiu apontando como urgente e necessária a luta contra o Novo Ensino Médio, uma pauta que unifica diferentes setores da sociedade contra o empresariado da educação, em defesa de um dos direitos essenciais da classe trabalhadora, a Educação pública, gratuita e de qualidade.
Osvaldo Coggiola iniciou destacando a preferência por usar a expressão movimento operário, a qual considera mais abrangente que movimento sindical. “Movimento sindical é apenas um aspecto do movimento operário. Não podemos limitar o conjunto da luta da classe operária ao movimento sindical”, observou. “Classe operária brasileira é parte da classe operária internacional. A única saída para a crise do Capital é internacional”, acrescentou.
Ele ressaltou ser importante agir para criar organizações de base que permitam combater, conjuntamente, com todas as categorias do movimento operário, as necessidades imediatas e históricas da classe trabalhadora.
O diretor do ANDES-SN destacou a necessidade de vincular as lutas brasileiras com as internacionais e relatou o processo de organização que culminou na construção do 2º Congresso Mundial contra o Neoliberalismo na Educação, realizado no início de junho no Panamá. O ANDES-SN esteve presente com uma delegação e irá contribuir para a organização do próximo congresso que será realizado no Rio de Janeiro, em 2024.
“Esse é um movimento que temos conseguido criar em nível educacional continental. Esse não foi um movimento que caiu do céu, nós o criamos. Decidimos criar um movimento continental com sindicatos e organizações para enfrentar os ataques do neoliberalismo na educação”, contou. Coggiola observou a necessidade e intenção de ampliar a participação e garantir a presença de trabalhadores e trabalhadoras da educação da África no próximo congresso.
O diretor do ANDES-SN fez ainda um resgate da história de construção das entidades sindicais no país, passando pela criação do ANDES-SN, da CUT, da CSP-Connlutas até o momento atual e reforçou o desafio de uma organização da classe trabalhadora que conte com os diferentes setores dos movimentos sindicais, sociais e populares. “Temos que nos inserir no cenário da História. Ela não pode ser acelerada ao bel-prazer de seus protagonistas”, alertou.
Tarde de sábado foi marcada por debates sobre lutas populares, sindicalismo e mercado de trabalho
Os debates sobre as lutas populares, sindicalismo, mercado de trabalho, o perfil da classe trabalhadora e os novos desafios impostos complementaram a programação deste segundo dia do Seminário Nacional sobre Reorganização da Classe Trabalhadora do ANDES-SN. Com mais de 80 participantes, o evento acontece de sexta (16) a domingo (18), na Universidade Federal do Semiárido (Ufersa), em Mossoró (RN).
No período da tarde, os trabalhos foram retomados com o debate “Lutas populares, sindicalismo e mercado de trabalho”, com explanação dos docentes Danilo Enrico Martuscelli, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), e Marcos Tavares, 1º vice-presidente da Regional Nordeste 3 do ANDES-SN e da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb). Flavia Spinelli Braga, da diretoria da Associação de Docentes da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (Aduern SSind.), mediou o debate.
Ambos docentes abordaram a história recente da organização dos movimentos sociai, sindicais e populares, além das condições de trabalho e emprego e o impacto da precarização e informalidade na sindicalização de trabalhadores e trabalhadoras, que apresentou queda significativa nos últimos 10 anos, segundo dados do Pnad.
Danilo pontuou que “num período mais recente, o modelo capitalista passou a vestir-se com roupagem propriamente autoritária, principalmente depois de 2008”. Para o docente da UFU, nesse período mais recente houve processos de resistência importantes, especialmente a partir de 2012, mas que não se traduziram em novas organizações de massa capazes de enfrentar o que estava por vir na agenda neoliberal de ataques.
Martuscelli reforçou a necessidade de unidade com demais movimentos dos setores populares e sindicais para uma reação em massa aos ataques à classe trabalhadora.
Marcos Tavares abordou o mercado de trabalho e os desafios para a classe trabalhadora. Segundo ele, as desigualdades das condições de trabalho e de jornada, às vezes são ainda mais expressivas do que as de salário, no entanto são pouco refletidas. O docente trouxe dados da sindicalização e destacou que, enquanto nos setores autônomos ou privado, o índice de filiados e filiadas a entidades sindicais é baixo, no setor público essa parcela é bem maior. “Talvez por isso que conseguimos fazer a resistência necessária para derrotar e derrubar algumas medidas de retirada de direito dos trabalhadores, como a PEC 32”, refletiu.
De acordo com Tavares, as contradições do capitalismo vão se acirrar cada vez mais e, é nesse momento, que se pode reunir forças para avançar na superação dessa sociedade de exploração. “Para a gente de fato avançar no fortalecimento e na reorganização das nossas lutas, na perspectiva de superação das relações do Capital, precisamos avançar no diálogo, na compreensão e na sensibilidade”, afirmou o diretor do ANDES-SN.
Assista ao debate
Perfil da classe trabalhadora
O último debate do sábado teve como tema “O perfil da classe trabalhadora e os novos desafios”, com a participação de Ana Procópio, docente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), e de Cacau Pereira, pesquisador do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps). A mesa foi coordenada por Lemuel Rodrigues, do Grupo de Trabalho de Formação de Política Sindical (GTPFS) da Associação de Docentes da Uern (Aduern SSind.).
Ana Procópio destacou a necessidade de olhar para a história do país e da construção de nossa sociedade e a nossa classe. “A gente pode dizer que a nossa classe trabalhadora brasileira se constitui das violências e resistências que perduraram desde o período escravagista no Brasil”, ressaltou.
A docente lembrou que é fundamental que os movimentos sindicais, e seus e suas dirigentes, percebam quem está faltando nos espaços e construam a intencionalidade de equidade, para além das cotas. “No âmbito da formação sindical, precisamos incorporar os conteúdos das trabalhadoras e trabalhadores negras e negros, de mulheres e homens trans”, disse, sugerindo a construção de perfis dos sindicalizados e das sindicalizadas.
A professora da Uerj lembrou ainda que o anticapitalista tem que ser antirracista ou não será. Por outro lado, o antirracismo tem que ser anticapitalista ou não será. É assim que vamos esvaziar a contradição entre raça e classe. “A luta contra o novo ensino médio é antirracista”, exemplificou.
Cacau Pereira acrescentou que é fundamental trazer para o centro da discussão setores que representam mais da metade da classe trabalhadora do país. “O debate da nossa classe é o debate das mulheres, das negras e negros, da população LGBT”, afirmou.
O pesquisador do Ibeps disse que é necessário fazer o balanço sobre como a onda de terceirizações, especialmente após reforma trabalhista, foi encarada pelas entidades sindicais. “Temos uma luta política a travar, que significa repensar os sindicatos. Estamos numa quadra histórica dramática”, refletiu.
Ele destacou ainda a importância das entidades sindicais ampliarem o debate sobre assédio moral e sexual e ampliarem a discussão sobre esses temas com as categorias, uma vez que essas violências no ambiente de trabalho estão adoecendo a classe trabalhadora.
Assista à íntegra do debate.
Homenagem
Após o primeiro debate da tarde, as e os participantes foram à sede da Aduern SSind. para uma homenagem ao docente da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do ANDES-SN, Osvaldo Coggiola. Além de uma exposição de fotos, que resgataram diferentes momentos da militância de Coggiola, também foram apresentados alguns dos 70 livros escritos pelo docente ao longo de sua carreira.
Emocionado com o reconhecimento, Coggiola contou sua trajetória de militância no movimento estudantil e operário na Argentina, o exílio e formação acadêmica na França e a construção de sua carreira e militância docente e a importância do Sindicato Nacional nesse processo.
“Eu agradeço ao ANDES-SN porque me fez brasileiro e me fez também trabalhador da classe brasileira. E essa condição eu vou levar para o resto da minha existência”, afirmou Coggiola durante a homenagem.